Bolsonaro teria criado orçamento secreto para ter base; deputados baianos estariam em lista
DO BAHIA NOTÍCIAS – O presidente Jair Bolsonaro (sem partido), teria montado um esquena em 2020, para aumentar sua base de apoio no Congresso criou um orçamento paralelo de R$ 3 bilhões em emendas, boa parte delas destinada à compra de tratores e equipamentos agrícolas por preços até 259% acima dos valores de referência fixados pelo governo. Os deputados federais Cláudio Cajado (PP) e Charles Fernandes (PSD) estariam na lista das verbas.
Com os dados recebidos através de Lei de Acesso a Informação, obtida pelo Estado de São Paulo, o Ministério do Desenvolvimento Regional foi questionado sobre os dados e reconheceu que os parlamentares definiram como e onde aplicar R$ 3 bilhões de verbas próprias da pasta. “Os recursos oriundos de emenda de relator-geral foram executados conforme definição do Congresso Nacional”, informou a pasta, referindo-se à nova modalidade de emenda, chamada RP9, criada no atual governo.
Num primeiro momento, o ministério atribuiu à Secretaria de Governo da Presidência da República (Segov), então comandada pelo general Luiz Eduardo Ramos, a articulação envolvendo a destinação dos recursos do orçamento secreto.
O destino sem controle de dinheiro público aparece num conjunto de 101 ofícios enviados por deputados e senadores ao Ministério do Desenvolvimento Regional e órgãos vinculados para indicar como eles preferiam usar os recursos.
Segundo o Estadão, o deputado Charles Fernandes (PSD-BA), chegou a indicar até o CNPJ e o telefone para contato de uma associação beneficente à qual queria destinar uma retroescavadeira no interior da Bahia. O parlamentar escreveu que o item deve ser comprado por R$ 300 mil, o que supera em R$ 50 mil o preço de referência.
Já Cláudio Cajado (Progressistas-BA) disse que tratou da indicação de R$ 12 milhões com a Secretaria de Governo, na época chefiada por Ramos, razão pela qual pediu em ofício à Codevasf “minha cota autorizada pela Segov”. Ele nega que os recursos sejam em troca de apoio a Bolsonaro.
O detalhe é que, oficialmente, o próprio Bolsonaro vetou a tentativa do Congresso de impor o destino de um novo tipo de emenda (chamada RP9), criado no seu governo, por “contrariar o interesse público” e estimular o “personalismo”. Foi exatamente isso o que ele passou a ignorar após seu casamento com o Centrão.
Atual ministro da Casa Civil, era Ramos quem fazia, até março deste ano, a ponte entre governo e Congresso. A secretaria negou essa versão. O ministério de Rogério Marinho, então, ajustou sua explicação e atribuiu a destinação ao Congresso. Procurada por e-mail, a assessoria da pasta não enviou resposta sobre o fato de o presidente Jair Bolsonaro ter vetado o artigo que permitiria aos congressistas manejar os recursos.
Sobre compras de tratores e outras máquinas agrícolas terem sido aprovadas acima da tabela de referência do ministério, válida para este ano, a pasta justificou que “não se trata de um normativo”, e sim de um “material de apoio” para propostas dos parlamentares. Válida para 2021, a tabela foi elaborada em 2019, segundo o ministério, o que justificaria variações de preço. O Estadão encontrou, contudo, exemplos de aprovação de compras respeitando o preço de referência.
“Caso o valor do equipamento seja mais alto, será publicado um Termo Aditivo com aumento de contrapartida” do titular do convênio “para cobrir os custos necessários”, justificou o ministério. Apesar disso, a pasta não explicou por que, nos casos mostrados pela reportagem, disponibilizou os recursos acima dos valores de referência. Conforme a cartilha de emendas do ministério, a variação de preços deve ser bancada pelos municípios que irão receber os equipamentos, o que não ocorreu em ao menos 361 casos.
O ministério informou, ainda, que se o valor sair menor do que a pasta autorizou pagar, quando ocorrer a licitação, os recursos serão devolvidos aos cofres públicos.
O senador Davi Alcolumbre (DEM-AP) disse, por meio de assessoria, que não fez indicação para a compra dos tratores no Paraná. “Não existe nenhum documento oficial do senador Davi tratando de recursos ou emendas em nome de qualquer parlamentar. Por esta razão, o senador não vai comentar sobre planilhas não oficiais.” De todos os parlamentares listados em documento do governo obtida pelo Estadão, Alcolumbre foi o único a negar a indicação.
Questionado sobre R$ 277 milhões que pôde indicar, Alcolumbre afirmou que como presidente do Congresso tinha esse “papel de liderança” e atuava “para atendimento das demandas dos demais parlamentares, em procedimento rigorosamente dentro da legalidade”.