MEMÓRIA DA RESISTÊNCIA: Um itapetinguense contra o autoritarismo do regime militar
*Por J Rodrigues Vieira.
Nas últimas semanas, mais uma vez, tive o prazer de caminhar com minha filha, Patrícia Bahiana, pelas ruas centrais da cidade de São Paulo, onde juntos, buscamos compreender coisas semelhantes em nossas condições humanas. Em tais descobertas, ela, Patrícia, esteve num prédio projetado pelo arquiteto Ramos de Azevedo que abrigou o Departamento Estadual de Ordem Política e Social de São Paulo (Deops-SP), para onde eram levados os perseguidos políticos no período ditatorial brasileiro. Muitos dos que ali chegavam, eram torturados e mortos em suas celas de medo, sofrimento e dor.
Em janeiro de 2009, foi instalado naquele edifício, o Memorial da Resistência para dar lugar a luzes, cores, liberdade de ir e vir e vida ratificando seu compromisso com a ampla compreensão da memória e da história política do Brasil. Visitando seu Centro de Documentação e Memória, surpresa, Patrícia descobriu numa das antigas celas, uma inscrição remete a um preso da cidade de Itapetinga, município do médio sudoeste baiano. Quando conversamos sobre o assunto, ao sentir aquele ambiente trágico, refletimos sobre a geração que vivenciou esse período de lutar contra uma o regime militar, que não permitiam encontros em espaços públicos; participar de organizações partidárias e nem sequer ter uma opinião política. Período em que artistas e pensadores não podiam nas suas obras ou artigos expor nada que pudesse afetar o nefasto regime. Tudo era considerado subversivo ou suspeito e duramente reprimido com prisões, torturas e mesmo “desaparecimentos”. A propósito, dias antes, ouvimos juntos a música engajada do BaianaSystem e suas novas possibilidades sonoras; ouvimos juntos as fusões originais do rock com ritmos nordestinos tradicionais de Alceu Valença e outras experimentações durante a Virada Cultural do “Pertencimento”.
Sabemos que ainda nos dias de hoje, a vivência da democracia não se dá da mesma forma para distintas classes sociais. Por isso, em reflexões entre pai e filhos, poderíamos justo entender o que significa defender a constituição e também lutar para que o país dê salto ainda maiores na defesa dos direitos das mulheres, negros, LGBTQIAP+, povos indígenas e quilombolas, jovens e pessoas com deficiência; lutar em defesa de um país com mais liberdade, mais amor e respeito aos direitos humanos, reivindicando mais igualdade e liberdade para que num mundo com a sua perspectiva de futuro, não mais toleremos retrocessos e projetos que representem os interesses daqueles que, apenas, pretendem usar o aparelho do estado para manter privilégios.
Pois é… Foi assim, numa lanchonete no famoso cruzamento das avenidas Ipiranga e São João, uma reflexão entre pai e filha, deixou a pensar que muitas vezes, quem vê aquele prédio de tijolinhos aparentes, não sabe da sua selvagem finalidade no triste período ditatorial brasileiro (Ditadura Militar). Ali, Patrícia Bahiana descobriu uma conexão com nossas origens na luta por cidadania e direitos humanos, constatando que em suas celas e cubículos, nos quais eram amontoados os resistentes que lutaram contra o autoritarismo do regime militar, esteve um cidadão itapetinguense: gente de nossa região; gente de nossa gente.
*J Rodrigues Vieira é escritor e articulador sociocultural.