Policial que matou George Floyd é declarado culpado; veja principais momentos do julgamento
Jurados decidiram nesta terça-feira (20/4), por unanimidade, que o policial Derek Chauvin é culpado pela morte de George Floyd, morto em maio de 2020 na cidade de Minneapolis, nos Estados Unidos.
Filmagens mostram que Chauvin sufocou Floyd com seu joelho por mais de nove minutos, e a morte decorrente gerou protestos contra o racismo e a brutalidade policial em todo o mundo. Floyd era negro e tinha 48 anos.
Chauvin, 45, foi acusado e condenado por três crimes, previstos na Justiça americana e sem paralelos exatos com o ordenamento brasileiro.
Em uma tradução aproximada, seriam eles: homicídio doloso de segundo grau (a mais grave de todas, com pena de até 40 anos de prisão, demonstrando uma relação de causa e efeito entre conduta do acusado e morte); homicídio doloso de terceiro grau (demonstração de negligência com a vida humana, com pena máxima de 25 anos); e homícidio culposo de segundo grau (quando alguém submete outro a um “risco irracional”, colocando-o em risco de morte ou ferimentos graves, passível a pena de até 10 anos de prisão).
Nesta terça-feira (20/4), o presidente dos Estados Unidos, Joe Biden, afirmou que conversou com a família de Floyd no dia anterior por telefone. Sem se posicionar precisamente, Biden disse que está “rezando” para que “o veredito seja o veredito certo”.
A cidade de Minneapolis, no Estado de Minnesota, se preparou para esperados protestos, independente do veredito. O tribunal foi cercado por arames e barreiras, e também recebeu reforço na Guarda Nacional. Há dezenas de manifestantes em volta do prédio.
O julgamento durou três semanas, ouviu 45 testemunhas e incluiu horas de exibição de vídeos no tribunal. O júri. composto por sete mulheres e cinco homens (e seis pessoas brancas, quatro negras e duas multirraciais) levou dez horas para chegar a uma decisão final.
Destacamos aqui seus principais momentos.
1. Testemunhos carregados de lágrimas e arrependimentos
Alguns dos testemunhos mais impactantes ocorreram nos primeiros dias de julgamento.
Darnella, que tinha 17 anos no dia da morte de Floyd, é autora do vídeo que viralizou em todo o mundo mostrando a violenta detenção. Ela disse ao júri que depois, houve muitas noites em que não conseguiu dormir, pois ficou “pedindo desculpas a George Floyd por não ter feito mais, por não ter intervindo fisicamente e por não ter salvado sua vida.”
“Quando vejo George Floyd, vejo meu pai. Vejo meus irmãos, primos e tios. Porque eles são todos negros”, disse a jovem.
Charles McMillian, 61, também se emocionou ao dar seu testemunho — ele foi um dos primeiros a chegar à cena em maio de 2020, tentando convencer Floyd a entrar na viatura. A polícia foi acionada depois que Floyd usou uma nota falsa em uma loja de conveniência.
McMillian caiu em prantos ao assistir às imagens da detenção, dizendo que se sentiu “desamparado” à medida que os eventos aconteceram naquele dia. McMillian acrescentou que confrontou Chauvin depois que Floyd foi levado em uma ambulância porque “o que assistiu estava errado”.
A defesa do policial argumentou que a presença de outras pessoas influenciou as ações de Chauvin. O tribunal ouviu de um policial de Minneapolis, Peter Chang, que a multidão estava “muito agressiva com os policiais”, enquanto Nicole McKenzie, que treina a polícia local para emergências de saúde, afirmou que a presença de transeuntes pode dificultar que policiais percebam sinais preocupantes em pessoas detidas.
2. Menções à dependência química
Outro forte depoimento foi o de Courteney Ross, namorada de Floyd por três anos.
Ela lembrou do primeiro encontro deles, em um abrigo para pessoas sem teto, onde Floyd trabalhava como segurança. A namorada também destacou o quando ele ficou devastado pela morte da mãe em 2018.
Ross também disse ao tribunal que ela e o namorado sofriam de dores crônicas, o que levou a uma constante luta contra a dependências de opioides.
“Ficamos viciados e tentamos muito parar”, contou.
Um dos argumentos da defesa é que Floyd morreu principalmente pelas consequências do uso de opioides e de metanfetamina, detectados no corpo dele após o óbito, além de problemas cardíacos.
O advogado de defesa, Eric Nelson, afirmou que o histórico de “uso de substâncias controladas por Floyd é significativo”.
“Não é um problema de caráter — milhões de americanos sofrem com a crise dos opióides”, disse Nelson.
Mas, acrescentou o advogado, a dependência deveria colocar em questão o fator toxicológico de sua morte.
Promotores, por outro lado, argumentaram que foi a falta de oxigênio — e não o uso de drogas ou doenças cardíacas — a principal causa da morte de Floyd.
3. As falas dos médicos
A causa da morte de Floyd foi uma questão central para o julgamento, no qual a acusação sustentou que ele morreu de asfixia, enquanto a defesa apontou para o uso de drogas e problemas de saúde em geral.
Martin Tobin, médico especializado nos pulmões, usou imagens de vídeo para explicar o que aconteceu com a respiração de Floyd durante os nove minutos e meio em que ele ficou deitado sob o joelho de Chauvin.
Mesmo “uma pessoa saudável, submetida ao que o Sr. Floyd foi submetido, teria morrido”, disse o médico.
Uma testemunha chave para a defesa, o patologista forense David Fowler, disse que a causa da morte deveria ser classificada como “indeterminada” em vez de homicídio, porque havia “muitos fatores diferentes” em jogo.
Complicadores incluem o uso de drogas por Floyd e a possível intoxicação por monóxido de carbono do escapamento da viatura, acrescentou Fowler.
No entanto, durante o interrogatório, o médico concordou que Floyd deveria ter recebido assistência médica imediata quando teve uma parada cardíaca, pois ainda havia chances de salvar sua vida.
4. Avaliações técnicas do uso da força
Outra questão importante no julgamento foi se Derek Chauvin violou normas da polícia ao se ajoelhar no pescoço de George Floyd por nove minutos e meio.
Chefe da polícia de Minneapolis, Medaria Arradondo disse ao tribunal que o agente deveria ter parado de aplicar “aquele nível de força” no momento em que Floyd parou de apresentar resistência.
“Não faz parte do nosso treinamento e certamente não faz parte da nossa ética ou valores” manter tanta força, disse ele, responsável pela demissão de Chauvin no dia seguinte ao ocorrido.
Já Barry Brodd, testemunha de defesa e especialista em segurança, afirmou que as ações de Chauvin foram “justificadas” e que o policial agiu “com razoabilidade objetiva” por conta da “ameaça iminente” que Floyd representou ao resistir à prisão.
No entanto, ele admitiu os perigos da asfixia posicional — quando uma pessoa é impossibilitada de respirar em uma determinada posição — são bem conhecidos por policiais.
5. Acusado escolheu ficar em silêncio
No tribunal, Derek Chauvin confirmou ao juiz que não testemunharia.
“Eu invocarei o privilégio da Quinta Emenda hoje”, disse ele, referindo-se ao direito constitucional de permanecer em silêncio para evitar a autoincriminação.
Chauvin se declarou inocente nas três acusações.